Por André Ladeira
Empresário e sócio da AM Investimentos, que administra um pool de empresas no Brasil e nos Estados Unidos
O setor aéreo brasileiro é marcado por uma trajetória de altos e baixos, com diversas companhias aéreas enfrentando crises financeiras, processos de recuperação judicial e, em muitos casos, falência. Desde a década de 1990, quando o mercado foi aberto para a concorrência após o fim do monopólio da Varig, o setor tem enfrentado desafios estruturais, econômicos e regulatórios que dificultam a sustentabilidade das empresas. Enquanto em outros países as companhias aéreas conseguem operar com relativa estabilidade, no Brasil, o cenário é marcado por uma instabilidade crônica. Mas por que isso acontece?
O Passado: A Era de Ouro e a Queda da Varig
Na década de 1960 e 1970, a Varig era a principal companhia aérea do Brasil, símbolo de excelência e conectividade global. No entanto, a partir dos anos 1980, a empresa começou a enfrentar dificuldades financeiras, agravadas pela má gestão, custos elevados e a concorrência com novas empresas que surgiram após a abertura do mercado na década de 1990. A Varig entrou em recuperação judicial em 2005 e, em 2006, foi vendida para a Gol, marcando o fim de uma era.
A década de 1990 também viu o surgimento de novas companhias, como a TAM (hoje Latam), que rapidamente se tornou uma das principais players do mercado. No entanto, a concorrência acirrada e a falta de regulamentação adequada levaram a um cenário de instabilidade, com várias empresas fechando as portas, como a Transbrasil e a Vasp.
A Consolidação do Mercado e Novos Entrantes
Nos anos 2000, o mercado aéreo brasileiro passou por um processo de consolidação, com a Gol e a TAM dominando o cenário. A TAM, posteriormente, se fundiu com a chilena LAN, formando a Latam, que se tornou uma das maiores companhias aéreas da América Latina. A Gol, por sua vez, consolidou-se como uma empresa de baixo custo, focada em voos domésticos.
No entanto, mesmo com a consolidação, o setor continuou enfrentando desafios. A Azul, fundada em 2008 por David Neeleman, trouxe um novo modelo de negócios, com foco em cidades menores e uma experiência de voo diferenciada. A Azul rapidamente cresceu e se tornou uma das principais companhias do país, mas também enfrentou dificuldades financeiras, especialmente durante a pandemia de COVID-19 se estendendo até os dias atuais, onde, a crise é tanta que aviões estão parados nos hangares sem condições de manutenção e consequentemente voos.
A Crise Financeira e a Pandemia
A crise econômica que atingiu o Brasil a partir de 2014 teve um impacto significativo no setor aéreo. A queda no poder de compra dos brasileiros, combinada com o aumento dos custos operacionais, como o preço do combustível e a desvalorização do real, levou a uma redução na demanda por voos. A pandemia de COVID-19, em 2020, agravou ainda mais a situação, com uma queda drástica no número de passageiros e receitas.
Durante a pandemia, todas as principais companhias aéreas do Brasil entraram em recuperação judicial: Latam, Gol e Azul. A Avianca Brasil, que já enfrentava dificuldades, encerrou suas operações em 2019. A pandemia expôs as fragilidades do setor, que já vinha enfrentando problemas estruturais há anos.
Os Desafios Estruturais do Setor Aéreo no Brasil
Vários fatores contribuem para as dificuldades enfrentadas pelas companhias aéreas no Brasil. Em primeiro lugar, o custo operacional é extremamente alto. O preço do combustível de aviação no Brasil é um dos mais elevados do mundo, devido à carga tributária e à falta de concorrência no setor de refino. Além disso, a infraestrutura aeroportuária é deficiente, com aeroportos congestionados e taxas aeroportuárias elevadas.
Outro fator importante é a alta carga tributária. As companhias aéreas no Brasil são submetidas a uma série de impostos federais, estaduais e municipais, que encarecem as passagens e reduzem a competitividade do setor. A falta de políticas públicas consistentes para o setor também é um problema, com mudanças frequentes nas regras e na regulamentação.
A concorrência desleal e a falta de um ambiente regulatório estável também contribuem para a instabilidade do setor. Enquanto em outros países as companhias aéreas contam com um ambiente mais previsível e políticas de apoio, no Brasil, as empresas precisam lidar com uma série de incertezas e desafios adicionais.
Comparação com o Exterior
Em outros países, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, as companhias aéreas enfrentam desafios, mas conseguem operar com maior estabilidade. Isso se deve a uma série de fatores, como uma infraestrutura aeroportuária mais desenvolvida, custos operacionais mais baixos e um ambiente regulatório mais estável. Além disso, em muitos países, as companhias aéreas contam com apoio governamental em momentos de crise, como durante a pandemia.
No Brasil, no entanto, o setor aéreo é visto como um “mal necessário”, e as políticas públicas muitas vezes não levam em consideração as necessidades específicas do setor. A falta de investimento em infraestrutura e a alta carga tributária tornam o ambiente de negócios desfavorável para as companhias aéreas.
O Futuro do Setor Aéreo no Brasil
Apesar dos desafios, o setor aéreo brasileiro tem um potencial enorme. O Brasil é um país continental, com uma população de mais de 200 milhões de habitantes e uma demanda crescente por transporte aéreo. No entanto, para que o setor possa se desenvolver de forma sustentável, é necessário que haja uma mudança nas políticas públicas, com foco na redução da carga tributária, melhoria da infraestrutura aeroportuária e criação de um ambiente regulatório mais estável.
A recuperação das companhias aéreas após a pandemia será um processo lento e desafiador, mas com as medidas certas, é possível que o setor consiga se recuperar e voltar a crescer. A experiência internacional mostra que, com um ambiente de negócios favorável, as companhias aéreas podem ser um motor importante para o desenvolvimento econômico e social. No Brasil, no entanto, ainda há um longo caminho a percorrer para que isso se torne realidade. Enquanto isso, as companhias aéreas brasileiras continuam lutando para sobreviver em um ambiente hostil, onde a instabilidade e a incerteza são as únicas certezas.