Rafael Mesquita
Para os consumidores, o reflexo da alta dos juros é sentido nas restrições para financiar a casa própria ou o carro, além das dificuldades em parcelar compras no cartão de crédito. Já os empresários enfrentam obstáculos maiores para obter crédito destinado a investimentos, contratações e projetos de expansão. Ter uma das maiores taxas de juros reais do mundo tem provocado prejuízos significativos à economia brasileira.
Se antes o Brasil ocupava a quarta posição no ranking mundial dos países com maiores juros reais (taxa de juros descontada da inflação), a recente decisão do Banco Central de elevar a Selic em 0,50 ponto percentual, atingindo 14,75%, piorou o cenário. Agora, o País aparece em terceiro lugar (8,65%), atrás apenas de Rússia (9,17%) e Turquia (10,47%).
Em Goiás, a expectativa do varejo é de estagnação ou até mesmo uma leve retração nas vendas, em razão da elevação dos custos a prazo. “A queda é percebida no número de vendas ou no fluxo de clientes. Em comparação com 2024, esperamos um empate no faturamento e redução no volume de vendas, acompanhando o índice inflacionário projetado para este ano (5,55%)”, avalia o presidente do Sindicato do Comércio Varejista no Estado (Sindilojas-GO), José Reginaldo Garcia.
Segundo ele, o principal impacto está no custo do financiamento das vendas a prazo e na reposição de mercadorias. “A precaução dos empresários leva a investimentos mais contidos, o que, de certa forma, alimenta o ciclo negativo”, afirma. Garcia ressalta ainda que, em Goiás, os produtos de maior valor agregado são os mais afetados — especialmente os que dependem de financiamentos de médio e longo prazo, como os da linha branca (fogões, geladeiras e afins).
No Distrito Federal (DF), o crédito mais caro também tem gerado desestímulo ao consumo e contribuído para o aumento da inadimplência. Os setores mais impactados são os que dependem fortemente de financiamento ao consumidor, como os de veículos, motocicletas, móveis e eletrodomésticos.
Ainda assim, há uma capacidade maior de adaptação à realidade imposta pelo Banco Central. “Apesar desses desafios, o comércio varejista do DF mostrou resiliência, com crescimento de 8,4% em 2024, superando a média nacional. Para 2025, ainda não há projeção clara de queda nas vendas — espera-se apenas mais cautela por parte do consumidor”, afirma o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas do Distrito Federal (CDL-DF), Eduardo Rodrigues.

O economista Cláudio Henrique de Oliveira concorda que a alta da Selic tem aprofundado a desaceleração econômica e atingido em cheio o setor produtivo. “Nos serviços, o impacto é mais lento, já que o consumo das famílias costuma se manter mesmo com queda na renda, acreditando que essa perda é temporária. Mas na indústria e no comércio, há queda na produção, redução de encomendas e possibilidade de fechamento de postos de trabalho”, explica.
Ele também alerta para o fato de que o cenário favorece aplicações financeiras em detrimento da produção, desestimulando a inovação e reduzindo a competitividade. “A população também sofre, principalmente pela dificuldade de acesso ao crédito pessoal e pela contenção no consumo, o que impacta diretamente a qualidade de vida. Bens duráveis e financiamentos habitacionais se tornam menos acessíveis, e a geração de empregos também é prejudicada, afetando renda e bem-estar das famílias”, afirma o economista.

Perspectivas para o futuro
O mercado projeta manutenção da Selic até o fim deste ano, encerrando um ciclo de seis altas consecutivas e mantendo a taxa básica de juros no maior patamar desde 2006. A edição mais recente do Boletim Focus indica que a Selic deve seguir em 14,75% até dezembro. Para 2026, espera-se estabilidade na primeira reunião do ano e um corte de 0,25 ponto percentual — para 14,5% — apenas no segundo encontro do Comitê de Política Monetária (Copom).
Apesar disso, a última ata do Copom não confirmou o fim do ciclo de alta. Os diretores do Banco Central destacaram o compromisso de levar a inflação ao centro da meta e ressaltaram que os próximos passos seguem incertos, diante de um “cenário de elevada incerteza”.
A continuidade ou não da elevação dos juros dependerá da evolução dos indicadores econômicos, especialmente da inflação e das expectativas do mercado. “Se houver pressão inflacionária persistente, vinda de fatores internos ou externos, o Banco Central poderá considerar novas altas. No entanto, muitos agentes econômicos já projetam uma estabilização da taxa, diante dos sinais de desaceleração da atividade”, observa Cláudio Henrique de Oliveira.
Ele reforça que novas elevações seriam prejudiciais ao país. “O ideal é que o Brasil caminhe para uma estabilização e, depois, para um ciclo de redução dos juros, com segurança e responsabilidade fiscal.” Para o economista, há falhas neste último aspecto e os impactos são graves. “O aumento descontrolado da dívida pública eleva o risco-país, prejudica a confiança dos investidores e encarece o financiamento do Estado, comprometendo o crescimento econômico. E esse problema tem sido ignorado ano após ano”, afirma.
José Reginaldo Garcia, presidente do Sindilojas-GO, tem opinião semelhante. “O problema é estrutural. Os juros altos são consequência de uma administração federal desastrosa. Não existe juro baixo com déficit fiscal e sem investimentos”, diz. Ele também atribui a situação aos programas sociais do governo federal. “Há ainda a falta de mão de obra e a baixa renda, causadas pelo volume de assistências sociais pagas”, opina.

Com uma visão mais cautelosa, o presidente da CDL-DF afirma que os empresários acompanham com otimismo as análises de mercado que indicam o fim das altas da Selic. Eduardo Rodrigues acredita que a mudança na trajetória dos juros pode facilitar o crédito, estimular o consumo e impulsionar o comércio varejista. “Ainda assim, fatores como inflação, nível de emprego e confiança do consumidor seguirão influenciando o desempenho do setor”, finaliza.