Até 1977, o Brasil não permitia o divórcio. Casais quA Justiça brasileira parece funcionar em um tempo paralelo lento, ritualístico e distante da urgência da vida real. Não é à toa que, ao falar em entrar com uma ação, a reação mais comum é um suspiro seguido de: “Ah, mas isso vai demorar anos…”. Enquanto o processo caminha, a vida não pausa: as dores persistem, contas continuam vencendo e problemas continuam exigindo respostas imediatas. E essa percepção não nasce de drama ou exagero; nasce de um funcionamento que insiste em se manter distante da realidade social.
A lentidão não é um acidente; é um traço estrutural. Nosso modelo jurídico brasileiro nasceu cartorial, presencial e solene, moldado por tradições coloniais e pela burocracia portuguesa. Era um sistema criado para controlar, não para agilizar. Mas aqui a pergunta importante é: a culpa ainda é desse passado ou continuamos alimentando velhos ritos, utilizando apenas uma máscara de modernidade?
Digitalizamos os processos, mas mantivemos a mentalidade de papel. Mudamos a plataforma, mas preservamos um mesmo ritual. A tecnologia entrou, mas não transformou a lógica, apenas digitalizamos os obstáculos.
A quantidade de etapas, assinaturas, autenticações e protocolos não é aleatória. Ela nasce de um princípio silencioso que atravessa o Judiciário “a presunção de má-fé”.
O Estado desconfia do cidadão.
O cidadão desconfia do Estado.
E dessa desconfiança mútua surge uma coreografia exaustivamente repetida, uma sequência de atos burocráticos que todos conhecem, mas ninguém ousa questionar. É um roteiro antigo, ensaiado, que se perpetua pois ninguém confia o suficiente para simplificar.
No fim, quem paga essa conta somos nós. Atrás de cada decisão, cada despacho e cada atraso existem pessoas com limites, falhas, pressões e prioridades. A Justiça não é uma entidade divina; é um conjunto de seres humanos julgando outros seres humanos, operando sistemas novos com mentalidade antiga e carregando uma herança histórica que não escolheram.
Entender as razões históricas, estruturais e humanas da lentidão não significa justificá-la. Porque, na prática, quando a Justiça chega tarde, ela não repara, não protege e não resolve, apenas formaliza o atraso. E quando isso acontece, a Justiça não apenas demora; ela falha.

Hellen Vitória Santana Neves,
Advogada associada no escritório Dênerson Rosa Sociedade de Advogados.














