Por Rafael Vaz
Apesar de ser o berço da história de Goiânia, Campinas se tornou, nas últimas décadas, apenas um bairro sem o devido reconhecimento dentro da capital. Com mais de 200 anos de história, a antiga cidade foi absorvida pela nova metrópole e, ao longo dos 91 anos de Goiânia, não recebeu investimentos que resgatassem sua relevância. Não há qualquer iniciativa pública ou privada que simbolize sua importância.
“Somos um dos maiores bairros de Goiânia e, quando se fala em bairro comercial, não há a menor dúvida de que Campinas é o maior. Tudo que é preciso comprar se encontra aqui”, garante a presidente da Associação de Lojistas de Campinas, Margareth Sarmento. Segundo ela, o bairro tem sido cada vez mais negligenciado. “Não estamos amando nossa própria história de uma forma geral. O poder público enxerga Campinas como um bairro pronto, que não precisa de mais investimentos, o que não é verdade”, avalia.
O tripé dos investimentos privados passou longe de Campinas. O bairro não recebeu grandes empreendimentos imobiliários residenciais, escritórios corporativos ou shoppings de grande porte. O centro comercial mais próximo, o Cerrado, foi construído no Aeroviário, enquanto Campinas permaneceu com sua paisagem predominantemente térrea, repleta de casas antigas e comércios, muitos deles vazios ou disponíveis para aluguel.
Esse processo de descaracterização não é exclusivo de Campinas. A Cidade de Goiás também enfrentou um esvaziamento e perda de prestígio após a transferência da capital, sofrendo anos de abandono. “Diferente de outros processos mudancistas, na Cidade de Goiás, toda a rede de ensino foi retirada e transferida para Goiânia”, explica o presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, Jales Guedes.
No entanto, nas últimas décadas, houve um esforço para resgatar sua história e seu valor cultural. Campinas, por outro lado, permaneceu à margem, sem investimentos significativos e cada vez mais distante de sua própria identidade. O bairro perdeu protagonismo e encolheu economicamente. Sem incentivos públicos ou privados, viu seu desenvolvimento limitado ao comércio popular, congestionado e marcado por camelódromos
Margareth Sarmento também destaca a precariedade da infraestrutura local. “Unidades de saúde necessitam de reformas, colégios precisam ser remodelados, e faltam cursos para a área comercial. Precisamos de investimentos em capacitação para moradores e trabalhadores do bairro”, alerta.

Apesar da ausência de investimentos, Campinas segue como um dos maiores polos comerciais da capital. “O bairro arrecada muito, mas pouco retorna em benefícios. Praças estão abandonadas e servem de ponto para tráfico de drogas. O trânsito é caótico, e a Secretaria de Engenharia de Trânsito só aparece para multar, não para educar”, critica Margareth.
A presidente da Associação de Lojistas também ressalta que, durante as campanhas eleitorais, Campinas se transforma em destino obrigatório para candidatos em busca de votos, mas, passada a eleição, o bairro volta a ser esquecido. A ausência de políticas públicas voltadas à revitalização reforça a sensação de abandono. Para moradores e comerciantes, resgatar a história de Campinas e garantir investimentos estruturais são desafios urgentes para evitar que o bairro continue sendo apenas um ponto ignorado no mapa da capital.
Contexto histórico

Carinhosamente conhecida como Campininha, o bairro mais antigo de Goiânia se destaca pela sua forte presença no comércio varejista e atacadista. Foi em Campinas que se deu o acolhimento e o desenvolvimento inicial da capital. Em 1810, a região era um pequeno povoado chamado Arraial de Campinas, que ganhou notoriedade graças à beleza natural e às águas do Rio Meia Ponte e do Córrego Cascavel. Por volta de 1843, a localidade recebeu uma capela que, mais tarde, daria origem à famosa Matriz de Campinas, um ponto de congregação para moradores de toda a cidade, atraídos pelas novenas e missas celebradas no local.
A historiografia oficial sempre relatou que o interventor Pedro Ludovico Teixeira escolheu Campinas para a construção de Goiânia com base em um relatório de uma comissão que ele mesmo nomeou. Essa versão foi amplamente divulgada, incluindo por Pedro Ludovico em sua autobiografia. No entanto, uma pesquisa de Jales Guedes revela que Pedro já havia escolhido Campinas antes da comissão apresentar seu relatório.
Em seu livro A Invenção de Goiânia – O Outro Lado da Mudança, Jales Guedes apresenta evidências de que Pedro Ludovico já demonstrava sua preferência por Campinas, incluindo entrevistas e relatos de assessores. Em 1932, antes da formação da comissão, ele já afirmava publicamente que Campinas era um local ideal para a nova capital. Além disso, o prefeito da cidade na época revelou que Pedro já havia expressado sua admiração pelo lugar, que considerava perfeito para uma cidade moderna.
Em 1933, a comissão entregou a Pedro Ludovico um relatório recomendando Bonfim como o local, mas essa recomendação foi mantida em sigilo. Em março de 1934, o relatório foi alterado para indicar Campinas, e a mudança foi denunciada pelo jornal Lavoura do Comércio. Jales Guedes sugere que a escolha por Campinas foi estratégica, já que Pedro Ludovico buscava um local “neutro”, sem lideranças políticas fortes, como as que existiam em Bonfim.