O governo divulgou as contas públicas do 1º trimestre de 2025. Esta coluna tem provocado discussões sobre a gestão das contas públicas e sobre como essa questão tem sido tratada pela imprensa e analistas econômicos-financeiros. Tem-se enfatizado aqui o viés ideológico presente na abordagem do tema.
A imprensa e os analistas destacam e defendem os interesses de apenas uma parte da sociedade brasileira: os financistas detentores da dívida pública interna, em detrimento do restante da população. O orçamento público tem como objetivo atender às demandas setoriais da economia brasileira, bem como à população em geral, especialmente no que se refere a serviços públicos e ao bem-estar social.
Neste contexto, o presente artigo busca oferecer uma nova interpretação do orçamento público. Em vez de focar no resultado primário do governo — receitas menos despesas primárias —, a análise será feita sob uma ótica diferente: a das despesas totais do governo de abril de 2024 a março de 2025. Nesse intervalo, o governo gastou R$ 3,2 trilhões.
Desse total, R$ 1,3 trilhões foram destinados a benefícios previdenciários e sociais (41%); R$ 380 bilhões a gastos com pessoal (12%); R$ 561 bilhões a repasses constitucionais para ministérios e despesas discricioná rias (18%); e R$ 935 bilhões a pagamentos de juros da dívida pública (29%).
Como se pode observar, 29% dos gastos referem-se ao pagamento de juros aos detentores da dívida pública, enquanto 41% são destinados a toda a sociedade brasileira. A discrepância é significativa para um país em desenvolvimento como o Brasil, que ainda enfrenta grandes carências sociais e uma das maiores desigualdades do mundo. Atualmente, os juros reais no País estão entre os mais altos do mundo, situando-se em 10% ao ano, para combater uma inflação que está apenas 1 ponto percentual acima do limite máximo da meta: 5,5% (meta máxima de 4,5%). Trata-se de uma dose extremamente elevada para controlar a situação – uma medida que, ao invés de sanar a economia, pode comprometê-la ainda mais.
Nesse período, o resultado primário foi nulo (-0,11% do PIB), enquanto o resultado nominal foi de 7,91% do PIB, um déficit de R$ 947 bilhões – a diferença entre os gastos do governo (R$ 3,2 trilhões) e a arrecadação (R$ 2,3 trilhões). O viés ideológico da análise reside na insistência em destacar apenas o resultado entre receitas e despesas primárias, omitindo que o governo também precisa arcar com os juros da dívida pública. Por isso, frequentemente se afirma que há um déficit primário, ocultando o fato de que o verdadeiro vilão das despesas públicas são os gastos com a dívida, que figuram no déficit nominal.
Essa diferença negativa, entre impostos arrecadados e gastos governamentais, foi financiada por meio da emissão de moeda e do aumento do endividamento. Como resolver essa situação? Existem três caminhos possíveis:
1. Aumentar a arrecadação tributária sem ampliar a base tributária;
2. Melhorar a qualidade dos gastos primários do governo;
3. Adotar taxas de juros reais compatíveis com o crescimento da economia brasileira.
Desde o Plano Real, os juros praticados no Brasil são o principal fator do crescimento da dívida pública em relação ao PIB, mais do que os gastos primários do governo. Esse cenário decorre da financeirização da economia após o Plano Real. Para que o pagamento dos juros da dívida pública não leve a um aumento contínuo do endividamento, os juros reais não podem ultrapassar 4,5% ao ano.

Marcos Freitas,
doutorando em Turismo, mestre em Finanças, economista e sócio-fundador da AM Investimentos.