A queda do helicóptero de Ulisses Guimarães foi mais do que uma tragédia; foi o começo do silêncio da política como retórica para a união do País.
A perda de Ulisses fez o Brasil perder não somente o “Senhor Diretas”, mas também um símbolo da palavra como construção; da política que via no discurso a força capaz de edificar pontes ao invés de trincheiras.
Desde então, parece que as palavras na política foram deixando de servir à República para servir aos interesses de ocasião.
No Brasil, fala-se muito (e mal).
No Brasil, vive-se uma epidemia de palavras com discursos inflamados, com frases prontas e com vocabulário, cada vez mais, empobrecido, em que a eloquência perdeu para o grito populista.
O debate público virou uma arena na qual quem fala mais alto e raivosamente acredita ter razão; e quem argumenta é logo suspeito de fraqueza.
A degradação da linguagem política começou quando a eloquência deu lugar ao marketing populista; quando a retórica cedeu lugar à performance.
Como lembrava Hannah Arendt, quando as palavras deixam de designar a realidade, passam a disfarçá-la. É exatamente isso que há no Brasil: discursos que substituem ideias e insultos travestidos de opiniões rasteiras.
Até Ulisses, um político era julgado por sua capacidade de convencer; hoje, é medido por sua habilidade de provocar nas redes sociais.
O espetáculo substituiu o diálogo. A política passou a confundir a empatia com a encenação e, nesse cenário, as palavras foram perdendo valor de troca e ganhando valor de impacto. As palavras tornaram-se munição.
A violência retórica, tão banalizada quanto perigosa, é o sintoma mais visível dessa doença. O adversário virou inimigo, o contraditório virou ofensa, e a diferença virou ameaça. Cada frase é uma trincheira; e entre uma vírgula e uma mentira, muita coisa se perde: o respeito, a reflexão e, sobretudo, a confiança no poder da palavra como ponte.
Não há democracia que se sustente quando o discurso perde a razão de ser da política, que é o de aproximar pessoas em torno de um ideal comum. A palavra do político é, ou deveria ser, um ato de responsabilidade.
Quem fala ao povo fala sobre o povo, para o povo e do povo.
A recuperação da linguagem política passa, portanto, por um gesto simples e urgente: devolver sentido às palavras.
As nações não se destroem apenas com golpes. As nações ruem lentamente, sob o peso das distorções linguísticas.
É preciso, portanto, falar menos para ferir e mais para compreender; falar menos para vencer e mais para construir.
Afinal, cada verbo que degrada o outro é um tijolo a menos na casa da convivência democrática.

Carlos André Pereira Nunes,
Linguista, professor, advogado especializado em
redação de atos normativos, conselheiro da OAB, diretor
da ACIEG e Presidente do Instituto Carlos André.














