Por Rafael Mesquita
Sabe aquela sensação de que os jovens estão cada vez mais preocupados em combater o sedentarismo e realizar algum tipo de atividade física? Na prática, ela pode ser vista nas academias e parques, em que as pessoas se exercitam em busca de uma saúde melhor e do considerado “corpo perfeito”. Mas essa sensação não pode ser estendida a toda essa parcela da população. O sedentarismo ainda é extremamente comum em nosso meio, mesmo entre os mais jovens.
Dados do Governo Federal apontam que seis em cada dez adultos brasileiros não praticam atividades físicas no tempo livre nos níveis recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) — pelo menos 150 minutos de forma moderada ou 75 minutos em intensidade vigorosa. As consequências podem ser extremamente prejudiciais. “Há a possibilidade de desenvolvimento de doenças cardíacas, já que esse tipo de comportamento pode aumentar a obesidade, hipertensão e diabetes, que são fatores de risco para problemas do coração”, explica o cardiologista da equipe CDI Premium, Leonardo Sara.
Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, a taxa de internações por infarto em pessoas com menos de 40 anos passou de menos de 2 por 100 mil habitantes em 2000 para cerca de 5 por 100 mil em 2024, o que representa um aumento superior a 180% nessa faixa etária.
O cardiologista Leonardo Sara acredita que essa tendência seja resultado de uma combinação de fatores, principalmente relacionados ao estilo de vida moderno e hábitos menos saudáveis. “Além do sedentarismo, o tabagismo, a alimentação inadequada, o estresse, o histórico familiar de doença cardíaca e o uso de substâncias exógenas (drogas ilícitas e medicações como hormônios anabolizantes) são fatores que provavelmente estão contribuindo para este aumento observado”, avalia.

O chefe do serviço de cardiologia do Hospital das Clínicas da UFG, Aguinaldo Freitas Jr., destaca que longas jornadas de trabalho (de 55 ou mais horas semanais), comuns entre jovens executivos e empreendedores, também estão associadas ao maior risco de doença isquêmica (aproximadamente 17% para morte por doença isquêmica do coração). Ele ainda lembra da relação comum entre estresse e tensão exagerados no trabalho o risco maior de doença arterial coronária.
Para a surpresa de muitos, o infarto em jovens, embora menos comum do que em idosos, pode ser mais grave, já que o organismo não teve tempo de desenvolver os mecanismos de compensação que ocorrem com o envelhecimento das artérias. “Isso, devido a menor formação de vasos sanguíneos colaterais no coração, que ajudam a irrigar o músculo cardíaco em caso de obstrução”, explica Aguinaldo Freitas Jr.

Há ainda a resistência em buscar tratamento. “Os jovens têm risco de infarto mais grave, pois muitas vezes demoram a buscar ajuda médica, uma vez que não imaginam estar sendo vítimas de um evento cardiovascular”, avalia o cardiologista do Hospital do Coração de Goiás Thiago Veiga Jardim.
Segundo ele, um estudo brasileiro com pacientes mais jovens revelou que a mortalidade intra-hospitalar é de 1,5%, mas, a longo prazo, chegou a 9,8%, com 25,4% de reinfarto e 6,7% evoluindo para insuficiência cardíaca. “Ou seja, não é apenas a mortalidade que preocupa, mas o risco de sequelas e novos eventos entre esses pacientes”, afirma.
Jovem, vida saudável e paciente cardíaco
O empresário de Brasília, Diego Castro, 43 anos, tem o perfil de uma pessoa saudável. Está no peso adequado, tem uma alimentação balanceada, faz musculação há 15 anos e outros esportes esporadicamente, como corrida e bicicleta. Em um dia de 2023, acordou às cinco da manhã, como de costume, e foi para a academia. Após o treino, retornou para casa, foi se arrumar e levou os filhos para a escola. No caminho, sentiu uma dor generalizada no peito, como se tivesse feito um exercício mais pesado no dia. Chegou ao colégio, deixou as crianças, mas sentiu que algo não estava normal: estava cansado e ofegante. Pediu ajuda para a coordenadora da instituição. Ela mediu a pressão dele e constatou que estava bem elevada.
Por sorte, um casal de médicos, cuja filha também estuda na mesma escola, estava passando e o ajudou. “Eles indicaram que eu tomasse três comprimidos de ácido acetilsalicílico (o AAS) e que a medicação ajudaria enquanto eu não chegasse ao hospital”, lembra.

Ao chegar à unidade de saúde, um susto: foi constatado, por meio de dois exames de eletrocardiograma, que se tratava de infarto. Diego foi levado às pressas para a sala de cirurgia para fazer cateterismo e teve que colocar dois stents (pequeno tubo inserido em um vaso sanguíneo para manter a passagem aberta, permitindo que o sangue flua livremente). “O médico que fez o procedimento disse que o que me salvou de ter sequelas ou problemas maiores foi tomar o AAS”, recorda.
Diego explica que fazia exames de sangue periódicos, mas nunca havia ido a um cardiologista. Segundo os médicos, pedaços da placa coronária se movimentaram e desprenderam, causando o infarto. “Eu não tinha a mínima ideia de que existia uma placa dessas. Encaro a minha recuperação como uma nova chance para me cuidar melhor e ter mais tempo de qualidade com a família e pessoas que gosto”, afirma.
O chefe do serviço de cardiologia do Hospital das Clínicas da UFG explica que o problema ocorre mesmo em pessoas mais jovens que praticam atividade física, porque a causa do infarto pode estar relacionada a vários fatores. “Uma pessoa magra que faz atividade física pode ter colesterol elevado, genética não favorável, lipoproteína (a) elevada ou condições cardíacas silenciosas”, diz Aguinaldo Freitas Jr.. Ele explica que, para a medicina, a população jovem é aquela que sofre infarto com menos de 55 anos, mas que tem sido crescente a quantidade de pacientes considerados muito jovens, ou seja, com menos de 45 anos de idade.
Prevenção é o melhor remédio
A receita da vida saudável para prevenir doenças já é conhecida, mas, no caso de pacientes cardíacos, algumas dicas se tornam ainda mais importantes. O cardiologista do Hospital do Coração Thiago Veiga Jardim orienta, primeiramente, a evitar fatores de risco, como fumar, consumo excessivo de álcool, além do uso de drogas e anabolizantes. “É preciso também adotar uma alimentação equilibrada, rica em frutas, vegetais, fibras e pobre em sódio e gorduras saturadas”, afirma.
O especialista ainda apresenta outras orientações, como monitorar a pressão arterial, o colesterol e a glicemia, especialmente se houver histórico familiar. Os exercícios regulares também são fundamentais. “As atividades físicas frequentes ajudam a controlar peso, hipertensão, colesterol e glicemia”, explica.

Além do infarto, Leonardo Sara afirma que os problemas cardíacos mais comuns em pessoas jovens incluem: arritmias, anomalias congênitas, doenças valvares, doença arterial coronariana (geralmente associada a pessoas a partir dos 40 anos, mas crescentemente observada depois dos 30 anos). Há ainda os efeitos de condições como o uso de drogas sintéticas ou semissintéticas. “Apesar de menos comuns, esses problemas podem ser graves e requerem atenção médica”, avalia.
