Um abismo que a rede social nos trouxe é que filhos adultizados acabam sendo criados por adultos infantis. Adultos mentalmente infantilizados podem ser até piores do que crianças adultizadas, pois são eles que estabelecem um novo normal: etiquetar e embalar os filhos para vendê-los como posts.
Voltemos alguns anos e veremos que os pais sempre apostaram nos filhos. Desde que o mundo é mundo, os sucessores foram formados e educados para continuarem um legado, evoluir e representar a história da família – seja no campo social ou financeiro. O pai investe no filho com educação e cultura como base. Hoje, o pai investe no filho comprando uma câmera 4k, um smartphone e um tripé. Faz do filho um ator ou atriz, prostituindo sua infância em troca de “recebido” (de bagulho a produtos de luxo enviado em troca de postagem) ou “publis”.
O engasgo que está se formando não está naquela ou naquele sujeito que vende o próprio filho e seus fatos nas redes sociais diariamente como se fosse a melhor novela da vida real; vai além. Eles vendem o modelo de sucesso da prateleira, porque o que vale são os milhões que ganham e o mundo de sonhos que vivem.
É uma indústria de desequilibrados, rodando uma esteira infinita de pais malucos para vender seus filhos como bananas na feira. Para cada caso bem-sucedido de pais escravizadores de filhos, existem milhares tentando a mesma “estratégia” e milhões sonhando em ser do mesmo jeito.
Estes milhares e milhões não vão fracassar, mas não sem antes destruírem a percepção de vida dos filhos, que serão futuros adultos mentalmente afetados: ou inseguros demais para seguirem bem suas vidas, ou seguros demais para se tornarem párias de uma sociedade comum. Porque venderam para eles (e o que se aprende na primeira infância leva-se para toda a vida) que nunca foram comuns. Ou seja, serão loucos por atenção pelo resto da vida, e isso é o maior perigo de todos os perigos.
Enquanto o Brasil discute novas leis para proteger a infância, é intrigante pensar na ironia do nosso tempo: talvez logo precisemos de leis que obriguem os adultos a se comportarem como tal. A fronteira entre ser adulto e criança nunca foi tão fluida, e os efeitos dessa confusão de papéis estão chacoalhando o mundo dos negócios. Podemos refletir como compra, trabalha e vive hoje a primeira geração nativa de internet e os efeitos que provocam nas empresas hoje – o mercado de trabalho que o diga.
Por tudo isso, o comportamento adulto de hoje precisa ser estudado e controlado, com leis que imponham a maturidade, antes que mudemos toda sociedade, inclusive as regras de comportamento das empresas, para nos adequarmos ao normal de quem pariu para vender, como se fossem bezerros, e não crianças.
Leandro Resende – editor-chefe da Revista Leitura Estratégica
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