Por Rafael Mesquita
Ele não é dono de construtora ou grande empresário do setor. É advogado e quebrou um ciclo de mais de 40 anos de presidentes da maior entidade que representa o mercado de incorporação em Goiás. Felipe Melazzo foi para o comando da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Estado (Ademi-GO) com o objetivo de profissionalizá-la. “Em 45 anos de existência, a Ademi tinha uma tradição de ter na presidência apenas donos de empresas do setor. Foi preciso trazer uma visão mais independente. Na atual gestão, temos dedicação exclusiva à entidade”, explica Melazzo.
Primeiro, assumiu, em 2022, o cargo de superintendente-executivo da entidade, com o desafio de oferecer mais suporte e celeridade às ações estratégicas da diretoria. Com a mudança de estatuto da Associação, em novembro de 2023, toma posse como presidente. “Quando a gestão de uma entidade como a Ademi não é técnica, tem-se o questionamento da sociedade de que atuamos apenas para benefício próprio, dos empresários do setor”, avalia.
Para mudar a imagem da entidade, foi preciso levar uma visão mais institucional. A nova gestão criou auditorias, regras de compliance (conjunto de práticas que garantem que uma organização esteja em conformidade com normas e padrões éticos) bem definidas, comissões técnicas para discutir os assuntos regulatórios. “Hoje, sentamos à mesa com Equatorial, Saneago, Corpo de Bombeiros e Prefeitura para ajudar a definir normas técnicas e legislações para o setor. Isso nunca existiu”, afirma.
Outra conquista de Melazzo à frente da Ademi foi o lançamento de uma cartilha em parceria com o Ministério Público para combater as ilegalidades da incorporação no Estado e as cooperativas do setor que atuam de forma irregular. “Quando se tem maior isenção na tomada de decisões internas, fica mais fácil demonstrar isso externamente, o que mostra que o caminho que seguimos foi acertado”, acredita.
Segundo ele, a mudança de gestão adotada atende a uma necessidade do próprio associado. A Ademi tem 31 incorporadores e urbanistas que fazem empreendimentos urbanísticos via incorporação em Goiás como associados. Eles são, principalmente, de Goiânia e Aparecida de Goiânia, e representam 90% desse mercado no Estado.
A profissionalização de entidades como a Ademi é um caminho natural, de acordo com o presidente. “Em Goiás e no Brasil, temos vários exemplos semelhantes, entre eles: a Associação Brasileira Pró-Desenvolvimento Industrial do Estado (Adial-GO) e a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).”
Longa trajetória no setor
Ocupar um cargo de tamanha importância para o segmento de incorporação em Goiás foi fruto de uma longa trajetória de Felipe Melazzo. Em 2006, o advogado começou a atuar no Direito Imobiliário por meio do Sindicato da Indústria da Construção no Estado de Goiás (Sinduscon). Também atuou na Comissão de Conciliação Prévia, que busca resolver conflitos individuais trabalhistas com representantes dos sindicatos patronal e dos empregados do setor.
Em 2008, surge a parceria que transformou a carreira do futuro presidente da Ademi. Felipe se junta aos amigos Igor e Rodrigo na sociedade do escritório Freire, Araújo e Melazzo Advogados. Com atuação nas áreas cível, de família, tributária, consumerista e imobiliária, os profissionais ganham destaque na advocacia local. O sucesso os leva a atuar para grandes construtoras do Estado, entre elas: TCI, Consciente, Engel, Dinâmica e Enec.

A atuação pela Consciente Construtora e Incorporadora foi uma das mais marcantes na carreira profissional de Felipe. Em 2016, a empresa teve que parar as obras do Empreendimento Nexus Shopping & Business, na Avenida D com a 85, em Goiânia, por decisão judicial que questionava os impactos que a construção poderia causar na vizinhança e no trânsito da região do Setor Marista. “Fiquei até 2018 no caso. Realizamos negociação com 300 clientes. Apresentamos um plano de ação que teve adesão da maioria. Foram apenas duas ações judiciais contra a empresa”, lembra.
A Consciente Construtora retomou as obras do complexo somente em 2020. O projeto passou por uma profunda transformação e, ao invés do Nexus, o empreendimento recebeu o nome de World Trade Center (WTC), com torres comerciais e residenciais. A inauguração aconteceu no final de 2024. Após o caso, o presidente da construtora, Ilézio Inácio Ferreira, chamou Melazzo para ser o diretor-comercial da Consciente. “Na época, lancei grandes empreendimentos pela empresa, como o WTC e a Casa Brasileira (edifício residencial)”, lembra Felipe.
Em 2021, surge, por meio de um consultor da Ademi, o convite para integrar a Associação, que só se concretizou em 2022. “Estou afastado do escritório de advocacia para me dedicar 100% à entidade. Atuo apenas em alguns processos, mas meus sócios é que tocam o trabalho por lá”, explica. Neste ano, ainda foi eleito presidente do Conselho Jurídico da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, em que pretende atuar representando os interesses do setor nacionalmente.
Pensar Goiânia
O presidente da Ademi garante que, quando o assunto é Plano Diretor, a entidade trabalha para defender o que for melhor para a cidade. “No último Plano, fomos favoráveis à redução e limitação do adensamento da capital”, pontua.
Felipe Melazzo também acredita na necessidade urgente de revitalização do Centro de Goiânia. “É preciso fomentar o retorno da população para essa região com incentivos fiscais e investimentos do poder público”, acredita. Ele avalia que apenas levar moradias populares para lá não será o suficiente. “É necessária a construção, por exemplo, de apartamentos de até 500 mil reais para atrair pessoas que possam consumir no supermercado, restaurante e comércio locais”, avalia.

Outra região em Goiânia que preocupa, segundo ele, é o Setor Sul. “É um bairro que está morrendo, assim como já aconteceu com o Centro. Por que o Setor Bueno e o Jardim Goiás têm pessoas morando, comércio, lazer, e outras regiões não? Não se pode deixar que bairros tenham só um tipo de uso. Isso leva o local a ser fadado ao envelhecimento e à degradação”, acredita.
O advogado destaca que Goiânia está entre as melhores cidades brasileiras em gestão do espaço urbano. Por isso, ele afirma que a Ademi tem combatido os parcelamentos e construções ilegais de empreendimentos. O objetivo, segundo Melazzo, é impedir a formação de favelas e ocupações ilícitas do espaço urbano. “Hoje, temos um Plano Diretor de 2022 que trouxe polos de desenvolvimento para a cidade. Se ele for seguido, teremos uma capital cada vez melhor para se viver”, avalia.
Família e desafios
Nascido em 1976, em Copacabana, no Rio de Janeiro, Felipe Melazzo de Carvalho pouco se recorda do início da infância na capital fluminense. O pai, Felisberto Peixoto, estava na cidade para fazer o curso de Física Nuclear no Instituto Militar de Engenharia. Em 1978, recebeu um convite do Governo de Goiás para retornar ao Estado, onde havia se graduado anos antes em Engenharia Elétrica.

Felipe viveu em vários bairros de Goiânia, como: Jardim América, Marista e Nova Suíça. Mas foi em um apartamento alugado no Setor Pedro Ludovico o período em que recebeu a triste notícia de que o pai estava com leucemia, doença que levaria a vida de Felisberto com apenas 54 anos de idade. “Foi um baque. Eu tinha 27 anos. Estava no início do meu casamento. Muitas dificuldades financeiras, nem geladeira eu tinha em casa”, emociona-se.
Outro desafio foi a aprovação na prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Graduado em 1999 pela Faculdade Anhanguera, foi reprovado duas vezes. “Na primeira fase, objetiva, eu tirava nota 9. Já na segunda, subjetiva, errava um detalhe e era eliminado”, lembra. A esposa, Cristina Viana, com quem teve dois filhos, foi quem o fez acreditar. “Mérito da minha esposa, que não deixou eu abandonar o meu sonho e desistir de me tornar um advogado”, ressalta.