Por Rafael Mesquita
Conciliar o caminho da técnica e da descontração no ambiente de trabalho. A tradução para isso se resume no lema: brincando e falando sério. Milton Marinho, 49 anos, carrega essa ideia desde os tempos em que era professor de informática, na escola da família, quando tinha apenas 19 anos de idade. Nunca abandonou o magistério, apenas a área de atuação mudou. Os ensinamentos de informática se transformaram em lições de boas práticas de Recursos Humanos (RH). Primeiro aos alunos universitários, depois aos estudantes de pós-graduação.
Filho de uma mãe psicóloga e de um pai (já falecido) economista, Milton cresceu com o pensamento de tentar mesclar as duas áreas profissionais. O curso de graduação escolhido na Universidade Católica de Goiás foi inspirado na profissão da mãe, contrariando o pai, que gostaria que ele fosse engenheiro. Mas o pai também teria a sua contribuição na atuação profissional do filho. Não por acaso, Milton se especializou em cargos e salários. “Fui pra parte mais econômica da psicologia. É a minha vida retratando a minha família”, brinca.
Além da família, ele teve grandes influências que contribuíram para a sua formação. Uma delas veio ainda nos tempos de estagiário na Apoio Consultoria de Negócios. A empresa era comandada por uma profissional referência em RH em Goiás, Eli Cleusa Percílio. Na época, teve a oportunidade de estagiar em grandes empresas do ramo farmacêutico em Anápolis.
Ao se formar, já estava empregado: contratado para prestar consultoria nas indústrias em que atuava. Milton se considera um gestor de sonhos profissionais, atestando o seu próprio histórico de carreira. “Fui estagiário, consultor e, posteriormente, me tornei executivo dessas empresas. Minha história profissional é um exemplo de que é possível crescer dentro das companhias”, avalia.
Acreditando nessa ideia, Milton buscou, no curso de mestrado, estudar o empresário brasileiro e entender como o RH pode ser estratégico dentro de uma empresa. “Como a companhia ganha e partilha melhor? Minha psicologia é voltada para que empresas e colaboradores sejam beneficiados. Parece incoerente, mas é possível equacionar isso. Me coloco como um agente de transformação entre esses dois polos”, afirma.
O consultor trabalha com o conceito de que remuneração é muito mais um valor simbólico do que quanto o funcionário ganha em si. Ele entende que, nesse quesito, empresas e colaboradores podem ser beneficiados sem ter as mesmas vontades. Mas como achar algo comum em meio a interesses tão diferentes? “Sempre busco mostrar os indicadores, o peso e o efeito de se ter uma remuneração estratégica”, explica.
Segundo Milton, existem várias maneiras de pagar o profissional, de acordo com a lei, sem ser necessariamente pela via fixa que onera mais a folha de pagamento da empresa. “Trabalho o RH sob os aspectos administrativo, jurídico, mercadológico e psicológico. Por exemplo, ao invés de trabalhar um salário fixo, é possível pensar em pagar gratificações, bonificações e participações nos resultados. Eu aprendi com o empresário que se ele ganha mais, ele partilha melhor. Então, como podemos favorecer esse ganhar mais para partilhar melhor?”, provoca.
Milton explica que existem estudos que mostram que quatro são os fatores que mais fazem um funcionário deixar a empresa: falta de oportunidade de crescimento (política de carreira), qualidade da liderança, ausência de uma boa política de benefícios e de salários. “Para vencer resistências, eu trabalho com a versatilidade. Apresento oito políticas de remuneração para os empresários e os questiono: qual faz mais sentido para você?”, explica.
A valorização do profissional pode contribuir para resolver um problema tão comum do setor empresarial: a dificuldade de se encontrar mão de obra. “É um caminho de atratividade e retenção. Com isso, quem está fora quer ser contratado pelas empresas devido às políticas de pagamento e quem está dentro dificilmente vai querer sair”, acredita.

Para colocar em prática os conceitos que defende, em 2001, Milton montou o Grupo Remunere, que, em 2014, se tornou a Gestão Avante. Atualmente, ela atende 111 empresas com uma equipe de profissionais em consultoria de RH que atua em 21 estados brasileiros e outros países da América do Sul.
Uma das missões é orientar as empresas sobre como lidar com as transformações trazidas pelas novas gerações. “A transgeracionalidade é o maior desafio que os RHs precisam enfrentar. As novas gerações tratam o trabalho não como um objetivo em si, mas sim como um meio para se alcançá-lo. É diferente das gerações anteriores, que viviam para o trabalho”, avalia. Por isso, é preciso entender essas mudanças. “É necessário dualizar sem duelar. São muitas gerações no mesmo lugar com objetivos, culturas e propósitos diferentes”, avalia.
Outro desafio é garantir a saúde psíquica no ambiente de trabalho. “Sempre houve uma briga se é o indivíduo que vem adoecido ou se é o trabalho que adoece. Mas hoje se percebe que muitas das causas do trabalho favorecem o adoecimento”, explica. Segundo Milton, para garantir a salubridade mental, é necessário que a empresa tenha a preocupação com quatro fatores principais: relações de trabalho, estilo de liderança, condições físicas de trabalho e as recompensas para o trabalhador nesse processo.
Mesmo assim, o consultor avalia que é preciso achar um ponto de equilíbrio. “Não é possível culpar só a empresa ou só o funcionário pelo adoecimento. É preciso encontrar um ponto em que os dois agentes sejam compreendidos sem que se torne um embate. Essa é a grande contribuição da inteligência social (habilidade de entender e reagir adequadamente ao meio social e desenvolver relações saudáveis e produtivas) do RH de uma empresa”, analisa.
Mas nunca houve um cenário que confundiu tanto as empresas como a pandemia. O entendimento de não haver mais a necessidade de presença física para controlar a produtividade veio para ficar. Mesmo assim, Milton Marinho alerta que o “novo normal deixou uma marca” de que todos os colaboradores estão completamente disponíveis sempre, e isso deixou cicatrizes que dificilmente irão desaparecer. “Estamos perdendo a identidade real do verdadeiro profissional, que é aquele que quer ser um médico, um engenheiro. Hoje, os trabalhadores querem é estar disponíveis ao trabalho. As relações foram precarizadas. Isso não vai terminar bem. Buscam-se complementos de renda, sem que a pessoa se complete pessoal e profissionalmente”, acredita.
Ao mesmo tempo, Milton destaca que a pandemia foi importante para o empresário pensar que nem todo profissional precisa ter vínculo exclusivo. “Ele pode terceirizar os serviços de tecnologia da informação, de contabilidade, de limpeza. Isso melhora as questões trabalhistas e diminui a folha de pagamento”, ressalta.

E o futuro do RH? O que os colaboradores da área precisarão entender dentro do universo corporativo? “Sobretudo, que as empresas precisam fazer a adaptação direta às novas tecnologias e à inteligência artificial, repensando o modelo de trabalho”. E a relação com o trabalhador, como fica? “Ele precisará desenvolver a competência dentro desse universo”, acredita. Para o consultor, o cenário será de uma convivência harmônica entre a tecnologia e as inteligências sociais. “O futuro será o transformar da inteligência artificial e o reconsiderar das inteligências sociais. É um repensar muito disruptivo, mas natural dos momentos de transformação”, avalia.
Ensino, saúde, família e associativismo
O hábito de brincar e falar sério sobre os temas mais diversos resume a atuação profissional de Milton Marinho ao longo dos últimos 30 anos. “Costumo dizer que, diferente da minha vida pessoal, a profissional sempre foi promíscua (risos). Professor desde 1995 e, posteriormente, em paralelo com o magistério, me tornei executivo e consultor de grandes empresas”, se diverte.
A vida acadêmica o motiva até os dias atuais com os cursos de pós-graduação que ministra na Fundação Dom Cabral, no Ipog e em outras instituições. As aulas de remuneração estratégica, gestão de desempenho, indicadores de gestão de RH e psicologia organizacional despertam o gosto por ensinar e aprender. “Primeiro que a docência está no meu DNA familiar. Segundo que, para mim, não é rotina, é reinvenção. Cada turma me desafia a aprender de novo, a provocar novas reflexões e a transformar trajetórias — inclusive a minha. Ensinar é o exercício eterno de também continuar aprendendo”, emociona-se.

O consultor se considera não apenas um pensador de Recursos Humanos dentro das empresas. “Sou um agente estimulador das práticas de RH à gestão e da gestão para o RH. Sou um gestor dos três pilares: teoria, técnica e prática”, conceitua-se. Ele também é pesquisador e escritor do tema, com cinco obras já publicadas.
Além da capacidade de ensinar e aprender, um dos fatos mais marcantes para o consultor nos últimos anos aconteceu na vida pessoal: uma cirurgia bariátrica realizada em 2016, que o fez perder 50 quilos. “Melhorou o meu condicionamento diário no tênis e até virei maratonista, correndo em vários lugares do mundo”, comemora. A saúde e a melhor disposição trouxeram alívio e maior alegria inclusive à família: a esposa Ana Carolina e os filhos Vitor, 17 anos, e Téo, 11 anos.
A experiência profissional e de vida o credenciaram para contribuir com o associativismo. Em 2006, chegou à Associação Brasileira de Recursos Humanos de Goiás (ABRH-GO). Assumiu a presidência da entidade em 2022 e já está em seu segundo mandato. À frente da entidade, tem como principais desafios trabalhar questões como a empregabilidade, o desenvolvimento dos profissionais de RH, a valorização das melhores práticas do setor e promover o maior evento do segmento no Estado: o Goianarh.

Milton Marinho também é conselheiro da ABRH Brasil. Na associação, participa de missões internacionais representando a entidade. Ele também ocupa a função de presidente da Câmara de Gente e Gestão da Associação Comercial, Industrial e de Serviços do Estado (Acieg). “Meu compromisso no associativismo é atuar de forma voluntária e dedicar a minha experiência às entidades. Além de permitir o livre trânsito entre a empresa e o colaborador, estabelecendo uma rede de relacionamento”, afirma.