Por Rafael Mesquita
Estar no apartamento do empresário Marco Antônio Veiga 59, no Setor Oeste, em Goiânia, é voltar no tempo. É como se estivéssemos em um museu. Mais da metade do imóvel de 400 metros quadrados é destinada a itens da história de Goiás, do Brasil e do mundo. O próprio nome do prédio remete a uma importante personalidade do Estado: Solar Cora Coralina. A poetisa, aliás, visitou os pais do empresário, assim que ele nasceu, na cidade de Goiás. Cora entrou na casa declamando um poema: “Marco Antônio é fruto de um grande amor…”. Ainda o presenteou com roupa, touca e luvas feitas por ela mesma.
Para homenagear a cidade em que cresceu e foi criado, o goianiense de nascimento e vilaboense de coração fez, no apartamento, um quarto se tornar a Sala de Goiás. Lá, é possível encontrar um documento da casa de fundição do ouro, móveis da época em que a cidade era a capital do Estado, livro sobre o escultor Veiga Vale e da poetisa que o abençoou nos primeiros dias de vida, Cora Coralina. Há ainda mapas, pinturas e fotos que representam a história do município. “O espaço que criei aqui em casa é para homenagear os 300 anos da minha cidade (que serão completados em 2027)”, afirma Marco Antônio.

Na antiga Vila Boa (como era conhecida a cidade de Goiás), o empresário desenvolveu o gosto pela história. A família foi dona de um dos primeiros estúdios fotográficos do Brasil, o Foto Alencastro Veiga. “Aos 7 anos de idade, eu comecei a colecionar fotografias que meu tio tirou da cidade de Goiás no início do século XX”, relembra.
Ainda na cidade, a escola o incentivou. Foi no tradicional Colégio Sant’Ana, fundado pelas Irmãs Dominicanas, de forte influência da cultura francesa. “A escola prezava muito pela preservação da história, da memória. Estudei lá até a oitava série do ensino fundamental. Depois, quando saí, criei o memorial do colégio”, explica.
O empresário ainda pretende publicar um livro sobre a história da cidade. Ele prepara a obra há mais de 20 anos. “Será um trabalho que irá contar do início de Goiás até os dias atuais através de memórias fotográficas e desenhos reais de época. A obra irá mostrar, por exemplo, a evolução dos automóveis e dos trajes típicos ao longo das décadas”, descreve.
Família Imperial
O amor de Marco Antônio pela história vai além da cidade de Goiás. No escritório do apartamento do empresário, há um importante acervo da família imperial brasileira. Entre os itens, está um sofá fabricado por volta de 1860. Uma foto na parede mostra Dom Pedro II sentado nele. O móvel foi comprado por US$ 5 mil, em um antiquário de São Paulo.
Além do sofá, o empresário adquiriu, em um leilão virtual, um espelho e um aparador do século XIX pertencentes ao acervo da família imperial. Todas as peças têm sua originalidade certificada. Posteriormente, comprou uma lanterna imperial, que ajuda a iluminar o quarto, e uma miniatura da carruagem usada por Dom Pedro I. A coleção do empresário ainda conta com fotografias da família real e um espelho usado pela princesa Isabel, com o brasão do império. Há outro item adquirido através de um leilão feito por um ex-embaixador de Portugal no Brasil. “É o móvel feito de carvalho português de Dom João V, que é, para Portugal, tão importante quanto Napoleão foi para a França”, ressalta.
A história de outras culturas
Uma espada da guarda de Napoleão, um quadro com a pintura do líder da Revolução Francesa são itens que enriquecem o acervo do empresário. Mas a maior preciosidade que ele tem em seu apartamento é a mesa oriental do século XII, pertencente à XII Dinastia Song, que governou a China entre os anos de 960 a 1279. “Foi uma dinastia que fomentou muito as artes, a cultura naquele tempo”, explica. Há ainda, no mesmo ambiente do apartamento, peças chinesas do século XIX.
Nenhum dos itens do acervo foi comprado no mesmo lugar e na mesma época. “Tem toda uma história que, se você não souber conciliar, faz uma salada de pequi com manga que não combina. Para colecionar, é preciso também conhecer a história. Eu tenho um acervo de época”, afirma Marco Antônio.

Apesar do rico acervo, o empresário ainda não tem catalogadas todas as peças que possui. “Não sabemos quantos itens compõem a minha coleção. Estou começando a organizar o inventário do meu acervo, porque, no futuro, criarei uma fundação que levará o meu nome ou sobrenome”, destaca.
Mas as raridades não param por aí. “Passei a fazer vários contatos em Paris, Buenos Aires, Portugal e estou sempre atento a leilões virtuais de madrugada. Quando vou a outros países também procuro peças para ampliar a minha coleção. Tenho até um olheiro em Brasília para verificar os trâmites em embaixadas”, pontua.
Família, Covid e religiosidade
Utilizar a maior parte da casa para abrigar o acervo é uma missão apoiada pela família. O filho caçula, Enzo, 6 anos, brinca na sala em meio a itens de tanto valor histórico. Outro filho, o estudante do curso de Direito, Murilo, 19 anos, se interessa pelo assunto, assim como a esposa Thais Rezende. “Ela participa comigo, assistimos aulas sobre arte e história juntos todas as noites”, afirma.
Além das preciosidades de época, o apartamento de Marco Antônio chama a atenção pelo que ele denomina de Sala do Trono. Trata-se de um espaço por onde todo visitante passa ao entrar no imóvel. É o local onde o empresário faz suas orações todas as noites. Lá, é possível ver o terço recebido por ele das mãos do próprio papa Francisco. Além do Menino Jesus, destaque para a imagem da Virgem de Urkupiña, invocação boliviana de Virgem Maria, a quem é devoto e sempre pede algo que precisa.
A ideia de montar a Sala do Trono surgiu após um período difícil da vida de Marco Antônio. Ele ficou 12 dias em coma, entubado por causa da Covid-19. Se permanecesse mais três dias naquela situação, os médicos decretariam a morte cerebral, já que o empresário estava com encefalite (inflamação no cérebro, causada por infecção). Ele destaca o quanto a religiosidade é importante em sua vida. “Sempre fui muito católico. Eu e minha família. Fazer minhas orações noturnas aqui é algo que me sustenta”, relata.