Por Rafael Mesquita
Em 2000, quando recebeu o convite do amigo dos tempos de faculdade, Daniel Laperche, para ajudar na criação do Sicoob Engecred, Luís Alberto Pereira não tinha a mínima ideia do que era o cooperativismo. Mal sabia que aquela iniciativa transformaria a sua vida. “À medida que fui me dedicando, fui me identificando e o próprio movimento veio me buscando”, afirma. A entidade nasceu com o objetivo de atender setores do segmento de engenharia e com os sete princípios do cooperativismo como lema: adesão livre e voluntária; gestão democrática; participação econômica; autonomia e independência; educação, formação e informação; intercooperação e interesse pela comunidade. “No cooperativismo, os interesses são mais coletivos. Senti o ambiente mais leve, mais fácil de fazer parcerias. Não é o capital que tem mais valor, mas sim as pessoas. O interesse pela comunidade e a busca por um propósito me encantaram”, explica.
Palavra de quem tem experiência na iniciativa privada e de mais de 30 anos ocupando diversos cargos na Secretaria da Fazenda do Estado. Foi um longo caminho no cooperativismo até a presidência do Sistema OCB/GO. Na recém-criada Sicoob Engecred, assumiu o cargo de diretor financeiro. Mas foi em 2009 que o mundo das cooperativas passou a ganhar maior importância na vida de Luís Alberto. Nesse período, tornou-se vice-presidente da entidade e, posteriormente, em 2011, passou a ocupar a presidência, iniciando um ciclo de sete anos. “Nessa época, já não ocupava mais cargos de direção na Secretaria da Fazenda, apenas o de auditor. Com isso, o cooperativismo passou a ter mais participação no meu cotidiano”, recorda.
Outro divisor de águas que transformou a vida de Luís Alberto aconteceu em 2015, com o convite para representar o setor de crédito no Sistema OCB-GO, entidade formada por 280 cooperativas de todo o Estado. Assumiu a vice-presidência na gestão de Joaquim Guilherme Barbosa de Souza. Em 2019, venceu a eleição para presidente, cargo para o qual foi reeleito em 2023. “Eu entrei no Sistema OCB, mas nem pensava em suceder o Joaquim Guilherme. Quando ele decidiu sair, eu me candidatei”, explica.
A dedicação exclusiva ao cooperativismo ocorreu muito em função da aposentadoria na Secretaria da Fazenda. Com o fim das atividades no setor público, decidiu se afastar também da gestão da empresa que criou, a Santa Cecília Engenharia. Afinal, com o crescimento do cooperativismo na economia, a exigência de uma gestão profissional se torna ainda maior. “Ao todo, o faturamento das cooperativas representa 10% do PIB goiano e nacional. Só em Goiás, são 30 bilhões de reais. Se levarmos em consideração os ativos que as cooperativas administram, o percentual aumenta para 20%, o que representa 70 bilhões de reais no Estado”, afirma.
O presidente do Sistema OCB-GO acredita que uma parte da sociedade ainda não enxerga a força do segmento, porque a representação dele no Produto Interno Bruto se mistura a outros setores. “A participação do cooperativismo deveria ser estratificada na formação do PIB. Atualmente, os nossos números se diluem entre os setores primário (agricultura e pecuária), secundário (indústria) e terciário (comércio e serviços), já que temos participação em todas as atividades econômicas”, avalia.
O crescimento do cooperativismo no Brasil e a diminuição da desconfiança em relação ao setor têm duas explicações fundamentais, no entendimento de Luís Alberto. Em 1999, a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop), entidade sem fins lucrativos que atua com o objetivo de promover a cultura do cooperativismo e o aperfeiçoamento da gestão nas cooperativas brasileiras, além da liderança nacional da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) no processo de profissionalização das entidades. “A partir daí, virou um sistema de fato, houve método, planejamento e trabalhou-se melhor a comunicação, a representação institucional com programas padronizados em todo o País”, acredita. Destaque ainda para a criação de uma frente de representação para defender os interesses da categoria no Congresso Nacional. Planejamento e articulação que reduzem a desconfiança de parte da sociedade. “Diminuiu muito a ideia de que cooperativa é mal administrada, hoje é nítida a visão mais empresarial das entidades”, afirma.
Em Goiás, as principais cooperativas estão ligadas aos setores do agronegócio, saúde e crédito. Destaque também para as de transporte e habitacionais. Com isso, o Sistema OCB-GO representa 280 cooperativas com faturamento de R$ 31 bilhões por ano. A entidade ainda administra R$ 70 bilhões em ativos de 700 mil cooperados. “Durante muito tempo, a Cooperativa Agroindustrial dos Produtores Rurais do Sudoeste Goiano (Comigo) foi isoladamente a única grande cooperativa do Estado. Mas, com o crescimento, ela ajudou a criar várias outras, sobretudo de crédito e agropecuárias”, explica. Segundo Luís Alberto, a expansão do agro e da economia de Goiás contribuiu para a diversificação de cooperativas dos mais diversos ramos.
Um dos segmentos é o de saúde. As mais de 20 Unimeds espalhadas pelos municípios goianos, as cooperativas dos médicos anestesiologistas (Coopanest-GO), a Uniodonto e as cooperativas de enfermeiros, radiologistas e de serviços de home care são exemplos da expansão do setor no Estado. “Nessa área, o cooperativismo presta um serviço importante como complemento da rede pública no cuidado às pessoas”, acredita. Luís Alberto explica que o Sistema OCB, representando essas entidades, busca estabelecer um contato direto com o poder público. “As Unimeds no Estado, por exemplo, se reuniram na nossa sede recentemente com o secretário de Economia, reivindicando a isenção de ICMS para medicamentos de alto custo com o objetivo de poder oferecer uma saúde mais barata para os beneficiários”, destaca.
E o futuro do cooperativismo? Para Luís Alberto, é promissor. “Vejo uma grande oportunidade de crescimento. Atualmente, 12% do crédito para o mercado nacional do varejo vem de cooperativas. Em outros países, principalmente da Europa, esse percentual chega a 30%, 50%. Temos muito potencial de crescimento”, acredita. O presidente do Sistema OCB-GO afirma que a prática mostra que o cooperativismo é a melhor alternativa para setores como o de produção rural. Nesse segmento, 50% do setor no país está ligado a alguma cooperativa, sendo que 80% dos cooperados são pequenos produtores.
Há ainda o potencial de crescimento dentro de setores como o de transportes — sobretudo o utilizado para escoamento da produção rural —, o de saúde, com o crescimento de beneficiários em busca de melhores serviços, e o de seguros, que ainda aguarda regulamentação. “As pessoas atualmente confiam mais, e a tendência é aumentar a confiança. É nítido o crescimento, principalmente das ligadas ao crédito. Prova disso é que R$ 50 bilhões de bens e dinheiro dos goianos estão nessas cooperativas”, avalia.

Passado e presente
Assim como muitos goianos que se destacam na capital, Luís Alberto Pereira, 65 anos, nasceu no interior do Estado, mais precisamente no município de Itauçu. Só se mudou de lá na adolescência para cursar o segundo grau em Goiânia. A aposta deu certo: passou na primeira tentativa no vestibular de Engenharia Civil da Universidade Federal de Goiás (UFG). Durante o curso, ainda ministrava aulas de disciplinas da área de exatas em escolas pré-vestibulares como forma de complementar a renda.
Uma oportunidade surgiu e o engenheiro não estava disposto a perdê-la. “Eu havia acabado de me formar na faculdade, quando decidi fazer o concurso do Fisco Estadual. Só tinha 40 dias para estudar e vencer a concorrência de 400 candidatos por vaga”, lembra. Com a matemática e a língua portuguesa não havia dificuldade. O problema inicial seria a contabilidade, a legislação fiscal e, sobretudo, a tributária. Foi quando ele ofereceu os serviços de professor a um cursinho voltado para concursos em troca das aulas da disciplina. “Ensinava meus próprios concorrentes e aprendia o que tinha dificuldade. Resultado: fui segundo colocado no concurso”, brinca. Uma semana depois, uma surpresa nada agradável: o concurso foi anulado, porque havia indícios de fraude. Um desespero para quem havia sido aprovado de forma honesta em uma das primeiras colocações. “Tive que estudar tudo de novo, mas consegui passar novamente. Dessa vez, em terceiro lugar”, recorda.
Era só alegria. A começar pelo salário — passaria a receber 50 vezes mais do que como professor. Na Secretaria da Fazenda, foi designado a trabalhar em Luziânia e Goiânia na auditoria de empresas beneficiárias do programa Fomentar, incentivo fiscal para atrair indústrias a Goiás. Em 1999, durante o governo Marconi Perillo, representou a Secretaria da Fazenda em uma comissão do Produzir, outro programa de incentivo fiscal do Governo do Estado. Também ocupou cargos de secretário executivo, superintendente, no Tesouro Estadual e na área de fiscalização.

Em 1993, abriu em sociedade com um amigo a Santa Cecília Engenharia, dedicada a obras de menor porte. A sociedade foi desfeita, e a esposa de Luís Alberto, Tania Cristina, se tornou a nova sócia do marido, ampliando os serviços oferecidos pela empresa, que se tornaria Santa Cecília Empresa de Engenharia e Arquitetura LTDA. Conciliou serviço público e iniciativa privada por um longo período. Com a aposentadoria, o casal abandonou de vez a gestão da companhia, deixando a função para os filhos Júlia e Amauri, que focam as ações nas áreas de arquitetura e energia.
Com foco profissional 100% no cooperativismo — o que demanda bastante serviço —, o presidente do Sistema OCB-GO não abre mão dos momentos de lazer com a família. “Aos finais de semana, saímos para almoçar. Uma vez por ano, viajamos pelo Brasil ou para o exterior. Mas, ultimamente, tenho preferido programas mais tranquilos, caseiros. Já fui muito rueiro, mas agora estou bem mais sossegado”, brinca.














