Ser cliente de banco no Brasil não é fácil. Os bancões tradicionais fazem, há várias décadas, a regra do jogo que eles mesmos jogam. O Governo, que tem o papel de regulador do mercado, acaba dependendo do sistema bancário para custear e rolar a dívida pública, tendo o banqueiro como parceiro nessa jornada. O Banco Central, órgão que controla e garante a solidez do sistema financeiro, poderia ter, em muitos aspectos, uma atuação mais dedicada a equilibrar a relação banco-cliente.
Um ponto me encuca. O Banco Central lançou, em 2022, um sistema para resgatar o dinheiro esquecido nos bancos no Brasil. Após um período de suspensão e a chegada de novas funcionalidade, o Sistema de Valores a Receber (SVR) foi retomado. Entre as novidades, a solicitação automática de valores via Pix para os que tiverem contas do portal gov.br de nível prata ou ouro. Em tese, essa campanha terminou em 2024.
Mesmo assim, parte considerável do dinheiro ainda ficou lá, nas contas dos bancos, bilhões e bilhões, com donos, mas sem uso.
Em 2024, uma proposta tranqueira, os titulares das contas teriam até 30 dias após a publicação da nova lei para resgatar os recursos que não foram movimentados por mais de 25 anos. Caso contrário, o dinheiro será direcionado ao Tesouro Nacional. Há prazos para contestação e pedido dos valores na Justiça. Ao pé da letra, um confisco – que pode ser provisório, porque admite devolver caso for solicitado.
Após aprovado a lei, o governo deu mais 30 dias após a publicação da nova lei para resgatar os recursos e teriam mais seis meses para reclamar os valores. Caso contrário, dinheiro seria direcionado ao Tesouro Nacional. Haverá prazos para contestação e pedido dos valores na Justiça.
O que me deixa pensativo é que, em valores atualizados pelo Banco Central, tem hoje mais de 48 milhões de pessoas com dinheiro esquecido nos bancos, o que soma mais de R$ 10,7 bilhões. Deste total, R$ 8 bilhões são de pessoas físicas e R$ 2,7 bilhões, de empresas. No total, depois de mais de três anos de “esforço”, foram devolvidos R$ 11,3 bilhões.
Mas o que incomoda é que quando, o banco precisa achar o consumidor para cobrar um cartão ou empréstimo atrasado, liga dez vezes no dia, manda e-mail, WhatsApp, manda até correio elegante em quadrilha cobrando o cliente devedor. No entanto, para devolver o dinheiro que está lá “parado” há vários anos, ele não movimenta um dedo, não liga, não manda e-mail nem correio elegante.
Para cobrar, o banco é um leão. Mas, para devolver o dinheiro esquecido nas contas, é um gatinho.
Ao Banco Central, cabia impor essa equivalência entre as constrangedoras ligações de cobrança, dia após dia, (que só no Brasil são tão embaraçosas e inoportunas) e as inócuas campanhas de devolução de dinheiro. Essa e outras passadas de pano só acontecem em uma relação de pai e mãe para filho.
LEANDRO RESENDE,
editor-chefe
Linkedin: leresende