A política fiscal brasileira vive uma encruzilhada histórica. Com a dívida bruta do Governo Federal superando os 76% do PIB em maio de 2025 — patamar elevado mesmo entre países emergentes — e um resultado primário que oscila entre déficit e superávit tímido, o Brasil se vê diante da necessidade de uma reforma estrutural profunda. Mas o que torna esse momento particularmente crítico não é apenas o tamanho da dívida, e sim a ausência de um projeto nacional que oriente o uso dos recursos públicos com racionalidade e visão de futuro.
Ao longo dos últimos anos, o debate público sobre finanças do Estado foi sequestrado por extremos. De um lado, o discurso neoliberal que defende corte de gastos, teto fiscal e privatizações como dogmas inquestionáveis. De outro, uma corrente neokeynesiana que propõe o gasto público como motor da economia e ferramenta de correção das desigualdades sociais. Esse embate, embora baseado em teorias legítimas, tem impedido o surgimento de soluções híbridas, democráticas e adaptadas à realidade brasileira.
A proposta apresentada neste artigo rompe com esse dilema binário. A sugestão é de uma nova arquitetura institucional: a criação do Conselho Nacional de Estratégia Fiscal (CNEF) — órgão suprapartidário composto por representantes dos três Poderes, sociedade civil, setor produtivo e comunidade acadêmica. Sua missão seria elaborar até três cenários de estratégia fiscal, cada um vinculado a projetos de País distintos, como industrialização, sustentabilidade ou inclusão social.
Esses cenários seriam debatidos em audiências públicas e votados pela população por meio de um referendo consultivo, institucionalizando a democracia fiscal. O cenário escolhido se tornaria base para a Lei de Diretrizes Estratégicas de Estado (LDES), com validade mínima de dez anos, garantindo estabilidade e previsibilidade, blindando o orçamento das oscilações políticas de curto prazo.
Entre os resultados esperados, destaca-se a construção de uma visão de País com horizonte estratégico, a superação da instabilidade institucional e a formação de um modelo brasileiro de governança fiscal. Ao abandonar o improviso e adotar planejamento de Estado, o Brasil pode recuperar sua credibilidade internacional, atrair investimentos e estruturar políticas públicas com maior impacto econômico e social.
O ponto central da proposta é reconhecer que as finanças públicas não são apenas questões técnicas — são decisões políticas que definem o projeto de País que queremos. Assim como o Plano Real foi fundamental para estabilizar a moeda, talvez este seja o momento de estruturar o “Plano Real das Contas Públicas” — uma reforma que, mais que técnica, seja estratégica, democrática e duradoura.
*Resumo de artigo científico apresentado para a Revista Contemporânea

Marcos Freitas,
doutorando em Turismo, mestre em Finanças, economista e sócio-fundador da AM Investimentos.