No início do século XIX, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire publicava sua obra Viagem ao interior do Brasil e, sobre Goiás, suas críticas ressoavam com a visão de um povo indolente e desinteressado pelo trabalho. Um século depois, com a Marcha para o Oeste, de Getúlio Vargas, surge Goiânia – uma capital então modesta, de um Estado ainda à margem dos principais centros de poder e desenvolvimento.
A subsequente construção de Brasília, uma metrópole moderna erguida no coração geográfico de Goiás, obscureceu, ironicamente, a importância do Estado para a concepção e instalação da nova capital federal.
Essa narrativa de irrelevância histórica, contudo, atualmente, se transformou em página de livro de história. Nas últimas duas décadas, Goiânia se consolidou como o epicentro da música sertaneja, uma das peças relevantes da indústria do entretenimento nacional e o gênero mais popular do País. Ao mesmo tempo, a pujança do agronegócio, principal vetor da economia nacional, tem no Centro-Oeste e em Goiás um protagonista deste avanço.
Mais do que isso, em um debate global dominado pela inteligência artificial, Goiânia inova ao sediar a primeira graduação sobre o tema na América Latina. A maior emissora do País, em um aceno significativo, escolheu a cidade como cenário para sua próxima novela. O vento, inegavelmente, virou.
Como líder de uma das maiores cooperativas financeiras do País, nascida e sediada em Goiânia, mas com atuação relevante em São Paulo, Minas Gerais, Tocantins e Distrito Federal, observo essa transformação de uma perspectiva privilegiada. Em 2024, ao trazer o CEO do Hospital Sírio-Libanês a Goiânia, testemunhei seu fascínio com a vitalidade local.
Pouco depois, em São Paulo, ele me enviou a capa de uma influente publicação econômica nacional com a manchete: “Todos querem um naco de Goiânia”. Essa percepção externa valida o que sentimos: o Estado está no radar de investidores e líderes de opinião.
Essa súbita e merecida atenção coloca Goiás em uma encruzilhada. Voltaremos à irrelevância do passado, nos contentando com a posição coadjuvante dos séculos XIX e XX, ou nosso brilho atual nos elevará a um papel de protagonismo como verdadeiro coração econômico e cultural do Brasil?
O desafio é imediato e crucial. A reforma tributária, com sua completa implementação, exigirá uma reavaliação estratégica das empresas, uma vez que a produção fora dos grandes centros econômicos do País, sem os incentivos fiscais anteriores, pode se tornar desvantajosa. Nesse cenário, aproveitar o momento de prosperidade – mesmo com a economia nacional estagnada – é uma imposição.
É preciso transformar a força do momento em ações concretas e de longo prazo. O caminho passa por investimentos em infraestrutura para fortalecer a agroindústria; criação de programas robustos para o desenvolvimento de tecnologias e empresas disruptivas, explorando o potencial de inovação local; políticas de incentivo e divulgação da “marca Goiás” por meio da cultura e do audiovisual; e apoio irrestrito ao cooperativismo, que, por sua natureza, está profundamente vinculado à comunidade, gerando prosperidade e desenvolvimento para todos.
Essas ações dependem de uma combinação de vontade política e anseio popular. A pujança de hoje não é uma garantia de futuro, mas uma oportunidade de construir um lar que seja, de fato, um polo de prosperidade. Mais desenvolvimento significa menos desigualdade, mais segurança e maior bem-estar para todos os goianos de nascimento ou de adoção. É uma escolha que precisamos fazer agora.

Diogo Mafia,
diretor-presidente do Sicoob UniCentro Br