O argumento mais repetido pelos defensores da reforma tributária é a previsibilidade. A alíquota única e o fim da guerra fiscal entre estados, de fato, reduzem o custo de conformidade e aumentam a transparência. No entanto, a introdução do “split payment” — mecanismo que transfere automaticamente ao fisco a parte do imposto na hora do pagamento — altera uma engrenagem fundamental da gestão financeira: o controle do caixa.
Ao retirar das empresas o poder de postergar o recolhimento de tributos dentro dos prazos legais, o “split payment” cria uma situação de fluxo de caixa “incompleto”. Isso pode ser devastador para empresas que operam com margens baixas ou com prazos longos de recebimento. A perda dessa flexibilidade é uma mudança estrutural silenciosa, que ainda não está sendo suficientemente discutida em moldes administrativos e departamentos financeiros de um modo em geral. A sugestão é que façam uma simulação sobre tais impactos.
A reforma promete também tornar mais ágil a devolução de créditos tributários. Essa seria, em teoria, uma boa notícia. No entanto, a promessa de eficiência do governo Federal em matéria de processos que historicamente são travados por burocracia e lentidão precisa ser recebida com cautela e uma dose de pessimismo.
Enquanto o reembolso não se materializa, o dinheiro fica parado — e esse tempo custa caro. Para setores com alta cadeia de insumos e operações tributadas em cascata (como indústria e agronegócio), isso significa mais capital de giro e, possivelmente, mais endividamento. Com juros em patamares estratosféricos (14,75% a.a./Selic) e crédito restrito, essa situação é tudo, menos favorável a qualquer pessoa que se julga o mínimo otimista.
A reforma também exige investimentos expressivos em tecnologia, consultoria tributária, treinamentos e atualização de sistemas internos. Para grandes empresas, isso será absorvido com alguma tranquilidade. Mas para pequenas e médias, a transição pode significar o comprometimento de recursos escassos e até mesmo paralisia operacional durante o processo de adaptação. As médias empresas sofrem muito nesse momento, pois não tem o capital financeiro e agilidade das grandes, mas em determinados momentos são engessadas como as pequenas.
A reforma tributária é necessária. Mas ela também representa um novo tipo de desafio para o caixa empresarial: um sistema mais previsível, porém menos maleável. Se o objetivo era dar mais estabilidade às contas públicas e mais transparência ao sistema, isso está em curso. Mas para o setor produtivo, o futuro reserva um jogo de cintura muito menor para gerenciar o tempo entre receber e pagar.
O risco não está apenas nos tributos — está em como e quando eles interferem no caixa da empresa. Aos responsáveis pela gestão financeira de negócios, mantenham o alerta ligado!

Rondinely Leal,
executivo com 20 anos de experiência em gestão, com atuação em grupos nacionais e multinacionais. Contador por formação com especialização em análise e auditoria, MBA em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria. Professor e consultor.